Patrick Morais

Usucapião: o que é e como funciona?

Sabias que podes adquirir legalmente um bem que não é teu, desde que o utilizes de forma contínua e prolongada ao longo do tempo? Este conceito chama-se usucapião, e é uma forma legal de obter a propriedade de um bem, mesmo sem teres comprado ou recebido o mesmo por herança. Neste artigo, explicamos o que é e como funciona este direito em Portugal.

O que é a usucapião?

De acordo com o artigo 1287º do Código Civil, a usucapião é um meio legal de adquirir a propriedade de um bem (ou outros direitos reais), desde que este tenha sido utilizado de forma contínua e com intenção de posse. Em outras palavras, se alguém age como proprietário de um imóvel, ou outro bem, durante um período de tempo determinado pela lei, sem que o verdadeiro dono o conteste, essa pessoa pode tornar-se o legítimo proprietário.

A usucapião começa a produzir efeitos retroativamente, ou seja, conta-se desde o momento em que a posse do bem foi iniciada. Contudo, não basta apenas utilizar o bem; é essencial que a posse seja exercida como se o possuidor fosse o legítimo proprietário, sem interrupções ou disputas.

Quanto tempo é necessário para invocar a usucapião?


O tempo necessário para adquirir um bem por usucapião depende do tipo de bem e da boa ou má fé do possuidor. O Código Civil determina os seguintes prazos:

Bens móveis não sujeitos a registo:
O direito de propriedade é adquirido ao fim de 3 anos de posse contínua (artigo 1299º).

Bens imóveis sujeitos a registo:
Com título de aquisição e posse de boa fé: 10 anos (artigo 1294º, alínea a).
Com título de aquisição e posse de má fé: 15 anos (artigo 1294º, alínea b).

Bens imóveis sem título de aquisição:
Posse de boa fé: 15 anos.
Posse de má fé: 20 anos (artigo 1296º).
Além disso, para que a usucapião seja válida, a posse deve ser pública e pacífica. O bem não pode estar envolvido em disputas, e o uso do bem deve ser reconhecido pela comunidade local como legítimo e contínuo.

Como invocar a usucapião para um bem imóvel?


Para adquirires legalmente um imóvel por usucapião, é necessário seguir um procedimento formal. Este começa com a escritura de justificação notarial, onde declaras ser o possuidor do bem e explicas os motivos pelos quais não tens um título de aquisição convencional. Também é necessário:

Recolher documentos que comprovem a posse contínua;
Apresentar três testemunhas que atestem o uso do bem;
Afixar editais públicos, para permitir que terceiros contestem, se for o caso;
Pagar os custos de registo e emolumentos;
Se não houver oposição de terceiros, o imóvel será legalmente registado em teu nome.

Exemplos práticos da usucapião:
Um terreno abandonado que foi cuidado e cultivado por um indivíduo durante 15 ou 20 anos pode ser reclamado por usucapião, desde que o uso tenha sido público e pacífico.
Casas alugadas não podem ser adquiridas por usucapião, uma vez que a relação entre inquilino e proprietário é estabelecida por contrato e não caracteriza intenção de posse.
Em casos de heranças não regularizadas, um herdeiro pode invocar usucapião para legitimar a posse de um bem que utiliza há muitos anos.

É possível reverter a usucapião?


Sim, se detetar que um bem seu está a ser indevidamente alvo de usucapião, pode recorrer à justiça para contestar o caso. É necessário provar que a posse não foi pacífica, que houve ocultação ou que os prazos legais não foram cumpridos.

A usucapião é um processo interessante que pode trazer benefícios, mas também desafios. Para garantir que está a agir de forma correta, ou para proteger os seus direitos, é recomendável o apoio de um advogado especializado em direito imobiliário.

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